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  • Foto do escritorWyldiany Oliveira

Números não deixam saudade

“não há quem goste de ser número, gente merece existir em prosa” ( Inumeráveis memorial)



O ano é 2020, o início de uma nova década marcada por crises no mundo inteiro, e qual a causa? A quem diga que é tudo culpa do novo coronavírus, é verdade, mas irei mais além.... Se formos olhar profundamente para cada âmbito da sociedade, diria que o problema não é apenas um novo vírus tão mortal capaz de gerar uma das piores pandemias da história da humanidade. Mas sim, um conjunto insano de fatores que contribuem para esse processo, dos quais se destacam, a falta de consciência humana, a luta e a ganância por poder aquisitivo, desigualdades sociais e raciais e principalmente descaso do poder público diante das mazelas que assolam a sociedade, principalmente no Brasil.


Segundo a Organização Mundial da Saúde a situação do Brasil é preocupante, diariamente centenas de pessoas morrem de Covid – 19 no país e a curva da doença continua em exponencial crescente. Enquanto isso, em outros países essa curva segue com decrescimento na taxa de confirmados e óbitos, isso se dá por uma causa: seriedade no combate da enfermidade. Importante lembrar que a Covid-19 não é uma questão de apartidarismo ou polarização política, mas sim questão de saúde pública, e acredite meu caro leitor, não é fake news, é tão real quanto o sol que aquece o planeta.



Os números da saudade são iguais ao infinito


Quem nunca sentiu saudade na vida não sabe o que é amar. Geralmente esse termo é usualmente utilizado pelas pessoas ao se referir ao ente querido que partiu ou a alguém que mora longe ou que não ver há muitos dias, mas que é tão querido a ponto de sua ausência fazer falta.


Milhares de pessoas morrem todos os anos por diversos causas, sejam por doenças ou violência e o que se tornam para o governo? NÚMEROS! Isso mesmo, mais um número para reforçar a importância das estatísticas nas pesquisas. Mas como podemos lidar com milhares (mais de 387 mil) de mortes causadas pelo covid-19 em todo o mundo? Não há respostas! É preciso lembrar que quem faz parte dessa estatística foi alguém de sorriso cativante, abraço acolhedor, tinha a voz aguda, fina, rouca, eram crianças, adultos, idosos, alguém que deixou saudade para a família e pode ter sido seu vizinho ou parente do seu amigo, amiga, irmão, irmã, pai, mãe, tios, tias, avó, avô... Pessoas que na simplicidade de seus dias viveram aqui, ali ou aí. Gente tão dócil que nem parece ser humano, mas verdadeiros “milagres” na vida de seus amores, familiares e amigos, já que davam sentido a sua existência.


Continua sendo apenas um número para você? Saiba que números não deixam saudade, pessoas sim, já que elas fazem parte dos momentos mais importantes do viver, pelo simples fato de existir. Pessoas marcam umas às outras, elas sofrem, sorriem, choram, gritam, falam baixo, falam alto, chegam e se vão e é nesse momento que o peso da despedida dói mais.


Veja como não são apenas números. Cada um tem um nome, idade, personalidade e significam muito ou tudo para outra pessoa, e como se despedir de uma pessoa que morreu de Covid-19? Como? Não há respostas, porque a dor é maior.

 

Senhor Sebastião Sales, 70 anos de histórias, nordestino, viveu em Fortaleza (CE) e teve uma vida marcada por muito amor pelos filhos e netos. “Um cabra cheio de histórias, um coração cheio de amores...” Andava com sua bicicleta cargueira e carregava não apenas frutas para presentear a família, mas o carinho que tinha em seu coração brincalhão e criativo. Um contador de histórias incríveis. Não é só um número!

 

Maranhense, Ana Caroline Mesquita, natural de São Luís era uma jovem adulta que viveu trinta e um anos de sua vida iluminando os outros com sua alegria, capaz de “melhorar o dia só de ela falar contigo”. Professora e dona de um sorriso radiante, tinha na vida não só a arte de lecionar, mas os “abraços mais aconchegantes e carinhosos”. Não é só um número!

 

Ruan Baldinelli, viveu em Jundiaí (SP), e foi por vinte e cinco anos um apaixonado pela vida. Jeito simples, admirado por muitas pessoas, era um “amigo de alma leve” que deixou uma grande lição de vida nesta viagem que é viver: “A vida é muito curta para vivermos de remorso”. Deixou lembranças e saudade. Não é só um número!

 

Amazonense, super mãe, avó e amiga, Natalícia Côrrea, viveu seus setenta e um anos de vida com zelo e carinho com todos que amava. Sua casa, era ponto de encontro de toda a família que se reuniam para se deliciarem da famosa “ torta de frango que tinha cheirinho de união”. Além desses momentos o mais gratificante era desfrutar de sua agradável companhia, conta o filho. Não é só um número!

 

Não são apenas pessoas de longe, tem o senhor João que morava ali na rua de cima, a dona Maria que fazia os melhores bolos do mundo e também alguém que você já conheceu um dia.


**Esses são alguns depoimentos de familiares e amigos, disponível no site Inumeráveis Memorial.


Nuances da gratidão e o peso da despedida


“A vida é dor e alegria, é partida e é chegada... e a chegada do abraço é a partida da saudade” (Bráulio Bessa)


A indescritível dor que muitas famílias têm sentido é um sentimento nos últimos dias que invadiu não só o coração, mas a alma. Ninguém está plenamente preparado para o momento em que o luto bate na porta da vida, e quando isso acontece diversas são as reações diante desse sentimento tão confuso para o raciocínio humano. Para alguns a dor da morte de um ente querido é tão insuportável a ponto do desespero tomar conta de si mesmo e desejar a morte, outros reagem no silêncio de sua simplicidade e não é que seja insensível, mas esta é a forma com a qual lida com o peso dessa despedida. Simplesmente, porque cada indivíduo possui suas particularidades e carregam histórias diferentes.


Enquanto isso, quando colocamos a gratidão e a despedida uma ao lado da outra o que vemos são contrastes de sentimentos similares. Grato pelo tempo que viveram juntos, pelas risadas e conversas bobas e até mesmo pelos momentos sérios, gratidão por ter convivido com quem se ama. A dor da despedida pesa não só ao coração, mas por inteiro como se um pedaço de si mesmo fosse retirado, e o que fica no lugar? A saudade.


Não são apenas números! São pessoas que partiram sem dizer adeus. Que se sentiram solitárias no leito de morte ou gratas por ter vivido ao lado daqueles que sempre amaram. Cada vida importa, cada pessoa é importante para alguém. Aquele “número” é o grande amor de alguém que agora virou estrelinha ou que voou como passarinho para um lugar mais distante.



Para conhecer mais histórias, confira no site do projeto Inumeráveis, o memorial dedicado à história de cada uma das vítimas do coronavírus no Brasil.


Você tem alguém que você ama né? Pois é, essa pessoa não é só um número, é alguém importante pra ti e você também és importante para alguém! Se cuide.


**Os nomes e histórias descritas aqui fazem parte do site Inumeráveis Memorial, produzido com a colaboração de vários jornalistas e voluntários.

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